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Tandem Heart – a luz no fim do túnel do choque cardiogênico refratário?

7 fev

Já publicamos aqui no Cardiopapers uma breve revisão sobre o dispositivo Tandem Heart. Esta semana no jacc saiu um artigo muito interessante mostrando uma situação em que esse dispositivo pode ser de fundamental importância. No estudo foram avaliados 117 pacientes com quadro de choque cardiogênico refratário ao uso de balão intra-aórtico. Destes 80 tinham cardiopatia isquêmica e 37 cardiopatia não isquêmica. Quase metade dos pctes tinham recebido reanimação cardiopulmonar logo antes ou mesmo durante a implantação do equipamento. Ou seja, a gravidade dos casos era incrivelmente grande.

O que se observou foi:

– O índice cardíaco médio aumentou de 0,5 para 3 L/(min.m2)

– a pressão arterial média subiu de 70 para 100 mmHg

– a SvO2 aumentou de 49 para 69,3%

– o débito urinario aumentou de 70 mL/dia para 1.200 mL/dia

– A creatinina caiu de 1,5 para 1,2

– o lactato caiu de 24 para 11

– a PAPO caiu de 31 para 17.

Ou seja, todos os parâmetros de micro e macrohemodinâmica avaliados melhoraram. Bem, mas isto não significaria muito coisa se os pctes não tivessem de fato tido um desfecho melhor (todos os parâmetros acima são chamados de surrogate end points, não são desfechos “duros”). O que se viu é após 30 dias 60% dos pctes estavam vivos. Após 6 meses este número caiu para 55%. No estudo todos os pctes eram submetidos a intervenção. Como não há grupo controle não se pode falar que houve diminuição de mortalidade de tal magnitude. Mas os médicos que manejam pacientes com choque cardiogênico no dia-a-dia sabem que certamente a mortalidade deste grupo de pacientes tende a ser bem maior do que a observada no estudo.

Referência: Kar B, Gregoric I, Basra S, et al. The percutaneous ventricular assist device in severe refractory cardiogenic shock. J Am Coll Cardiol 2010; DOI:10.1016/j.jacc.2010.08.613.

Macrolídeos + antagonistas dos canais de cálcio – risco de hipotensão grave

7 fev

Os antibióticos eritromicina e claritromicina ao serem utilizados em associação a antagonistas de canais de cálcio geram um risco alto de hipotensão importante, relata um estudo publicado recentemente no Canadian Medical Association Journal. O dado é de especial interesse para os cardiologistas uma vez que boa parte de seus pacientes estão em uso de antagonistas do cálcio por diversas indicações (controle de PA, angina, taquiarritmias, etc). Além disso, os macrolídeos são extensamente usados na prática clínica em especial para o tratamento de infecções respiratórias como pneumonia.

A hipótese de que poderia haver este risco quando do uso combinado das medicações veio do fato dos macrolídeos sabidamente inibirem o citocromo P450 (sempre ele) o qual é responsável pela metabolização dos antagonistas do cálcio. Com o citocromo inibido, os níveis séricos dos antagonistas do cálcio tendem a ficar bastante elevados, assim aumentando o risco de efeitos adversos como hipotensão.

Através de uma série de análises os pesquisadores chegaram a conclusão de que a eritromicina aumenta em 5,8 vezes o risco de hipotensão grave quando combinada com antagonistas do cálcio. Já com a claritromicina o aumento é de 3,7 vezes.

A boa notícia é que há boas alternativas nestes casos. O trabalho mostrou que a azitromicina não aumenta o risco de hipotensão. Isto também já era esperado uma vez que a mesma não atua no bendito P450. Por ter a mesma eficácia antimicrobiana que a claritromicina além de ser tomada apenas 1x ao dia (a claritromicina deve ser administrada a cada 12 horas) a azitromicina revela-se uma alternativa melhor para o tratamento de infecções respiratórias no cardiopata em uso de antagonistas do cálcio.

Resumindo:

– claritromicina + antagonistas do cálcio = risco de hipotensão grave/choque

– azitromicina + antagonistas do cálcio = tratamento eficaz sem risco de hipotensão

Referência: Wright AJ, Gomes T, Mamdani MM, et al. The risk of hypotension following co-prescription of macrolide antibiotics and calcium-channel blockers. CMAJ 2011; DOI:10.1503/cmaj.100702.

Hidroclorotiazida – droga de primeira linha para hipertensão?

30 jan

Sempre acreditou-se no uso de tiazídicos como droga de primeira linha para tratamento da hipertensão (HA). Em 97% dos casos, a droga escolhida é a hidroclorotiazida (HCT), nas doses de 12,5 a 25mg por dia. Em 2008, nos Estados Unidos, mais de 134 milhões de prescrições foram feitas com HCT (um terço em monoterapia). A segunda droga mais prescrita foi o atenolol, com 44 milhões de prescrições.

Uma meta-análise publicada recentemente no Journal of the American College of Cardiology (JACC) comparou o efeito de diversas drogas anti-hipertensivas na pressão arterial (PA) em 24hs. A queda da PA sistólica e diastólica com o uso de HCT 12,5 a 25mg foi significamente menor quando comparado a inibidores da ECA, bloqueadores do receptor de angiotensina, betabloqueadores e bloqueadores do canal de cálcio. Já quando comparamos essas drogas com HCT 50mg/dia, não houve diferença estatística.

Mas ao utilizar altas doses de HCT, é mais comum a ocorrência de efeitos colaterais, tais como hipocalemia, hiponatremia, hiperuricemia e resistência à insulina. Além disso, não há evidências que o uso de HCT nas doses habituais (12,5 a 25mg/dia) possam reduzir desfechos como IAM, AVC ou morte. Todos estudos que mostraram benefício em algum desses desfechos foram realizados ou com doses maiores de HCT ou com outro tiazídico, como a clortalidona ou a indapamida.

Resumindo, a eficácia anti-hipertensiva da HCT nas doses 12,5 e 25mg diárias é consistentemente inferior quando  comparada com outras classes de drogas. Assim, a HCT nessa dose não deve ser utilizada como primeira linha no tratamento da HA. Se optar pelo uso de algum tiazídico, preferir clortalidona ou indapamida.

Referência: Messerli FH, Makani H, Benjo A, Romero J, Alviar C, Bangalore S. Antihypertensive efficacy of hydrochlorothiazide as evaluated by ambulatory blood pressure monitoring. J Am Coll Cardiol 2011;57:590-600.

AVC no perioperatório de revascularização miocárdica: quais os fatores de risco? o que fazer para evitar?

27 jan

AVCi é uma complicação temida no período perioperatório de revascularização miocárdica. Em trabalhos publicados previamente notou-se que a maior causa de isquemia cerebral neste contexto são êmbolos de colesterol provenientes da aorta calcificada. Muitas estratégias vem sendo exploradas para diminuir este risco.

Um estudo publicado na edição do dia 26 de janeiro do JAMA revela a experiência da Cleveland Clinic em relação ao assunto. Foram analisados 45.432 pctes que foram submetidos a cirurgia de revascularização miocárdica de 1982 a 2009, sendo registrado a ocorrência de AVCi no perioperatório e os fatores de risco relacionadas com a morbidade.

Pontos importantes do estudo:

– a técnica cirúrgica com menor risco de AVCi foi a revasc sem CEC, seguida pela com CEC com técnica do beating-heart (na qual não se faz parada cardíaca induzida). Já na técnica com CEC mas com parada induzida, principalmente se associada com hipotermia, houve aumento do risco de isquemia cerebral.

–  o surgimento do AVC foi classificado em 2 períodos – intra-operatório quando o pcte acordava da anestesia já com déficit neurológico e pós-operatório quando ele acordava sem déficit e o desenvolvia posteriormente. Interessante foi que a maioria dos eventos ocorreu no período pós-operatório (58% do total). Motivo?? Questiona-se que o período de maior coagulabilidade/maior inflamação no pós-operatório possa explicar isto.

– O pico de AVC no pós-operatório ocorreu com 40h após o término da cirurgia

– Fatores de risco para AVC intra-operatório – presença de doença vascular periférica ou de doença carotídea, disfunção de VE, presença de lesão de Cx >70%, cirurgia com CEC e parada circulatória.

– Fatores de risco para AVC pós-operatório – idade avançada, AVCi prévio, lesão de tronco de coronária esquerda, diabetes, entre outros.

– A ocorrência de FA aguda no pós-operatório não foi fator de risco para AVC. Deve-se comentar contudo que no serviço estudado há a rotina de se tentar cardioverter toda FA aguda neste cenário (ou por medicamentos ou por CVE).  Apenas nos casos em que não se consegue reversão para ritmo sinusal é que se opta por controle da FC e anticoagulação. Isto pode ter ajudado para o fato de FA nova não ter aumentado o risco de AVC.

– A técnica com CEC produz revascularização mais completa, contudo às custas de maior risco de AVC. Já a técnica sem CEC traz menos risco de AVC mas sem produzir revascularização tão completa. O que os autores sugerem é que se escolha a técnica cirúrgica baseada no perfil do pcte. Caso seja um pcte jovem, com lesões coronarians difusas e sem aterosclerose aórtica importante o mais racional seria fazer cirurgia com CEC – o risco de AVCi do pcte já é pequeno no período perioperatório e ele se beneficiaria bastante de revascularização completa. Já em um pcte idoso, com “aorta em porcelana” (muito calcificada), com lesão complexa de DA proximal e e de Cd não dominante talvez fosse mais interessante fazer uma revasc sem CEC colocando mamária-DA e deixando a Cd sem intervenção ou mesmo abordar de forma percutânea posteriormente esta lesão.

Referência:  Tarakji K, Sabik J, Bhudia S. Temporal onset, risk factors, and outcomes associated with stroke after coronary artery bypass grafting. JAMA 2011; 305:381-390.

SHOCK Trial :SHould We Emergently Revascularize Occluded Coronaries for Cardiogenic ShocK

25 jan

Da Série dos grandes estudos, o Shock Trial veio para mudar paradigmas. Em 26 de agosto de 1999, este estudo randomizado multicêntrico foi publicado na New England Journal Of Medicine e fazia parte  de um conjunto da publicaçõe SHOCK Trial Study Group. Temporalmente foi realizado em uma época em que o choque cardiogênico era a principal causa de óbito dentre os pacientes hospitalizados e apresentava altas taxas de mortalidade( 70-80%).

O estudo incluiu 302 pacientes em choque devido, principalmente, disfunção ventricular esquerda secundário a infarto agudo do miocárdio, comparando uma estratégia de revascularização de emergência ( 152 pcts) versus uma conduta inicial de estabilização clínica do paciente ( 150pcts).

Apenas pacientes com choque cardiogênico com predominância de disfunção venricular esquerda secundária a IAM com Supra de ST ou presença de novo BRE foram incluídos.

Choque  Cardiogênico foi caracterizado  por critérios clínicos e hemodinâmicos que são importantes para compreensão da validade do estudo.

Clínicos:

  • PAS<90mmhg por 30 min antes do início de inotrópicos/ vasopressores OU inotrópicos ou balão  intra aórtico são necessários para manter a PAS >=90mmhg
  • Evidência de redução da perfusão tecidual ( Ex. Débito urinário<=30ml/h ou extremidades frias e mal perfundidas)
  • FC>= 60bpm

Hemodinâmicos:

  • Pressão de Arteria Pulmonar Ocluída >=15mm/hg
  • Índice Cardíaco<=2,2 L/min/m2

O objetivo primário do estudo foi avaliar a mortalidade de todas as causas em 30 dias. Os objetivos secundários foi a avaliação de mortalidade por todas as causas em 6 meses e no fim do Estudo; Mudanças em índices ecocardiográficos de mobilidade de parede; índice de dilatação de VE  e outras variáveis ecocardiográficas aferidas 2 semanas após a randomização e  antes da alta hospitalar; mudança na qualidade de vida e capacidade física em 2 semanas após a alta e em 6 meses após o IAM.

Foram incluídos os pacientes com choque cardiogênico iniciados até 36 horas do IAM e a randomização deveria ocorrer até 12 horas do diagnóstico do Choque

adaptado do www.medscape.com

O choque cardiogênico ocorreu em média 5 horas após o IAM no grupo de revascularização e 6,5h  no grupo de tratamento clínico inicial.

Os indivíduos  em choque cardiogênico tiveram comprometimento significatico de TCE em 20% dos pacientes e lesão triarteriais em 64% evidenciando uma FEVE média de 31% ( ventriculografia).

O suporte farmacológico com vasopressores/inotrópicos e BIA foi recomendados para todos os grupos e iniciados tão precoce fosse realizado o diagnóstico do choque.

Os pacientes do grupo revascularização deveriam ser submetidos a cineangiocoronariografia, idealmente em menos de 6 horas da randomização. O método de revascularização ( angioplastia ou Cirurgia de revascularização ) foi individualizado seguindo julgamento de um grupo de hemodinamicistas e cirurgiões. No grupo de tratamento clínico a revascularização deveria ocorrer com tempo mínimo de estabilização de 54 horas.

A angioplastia era preferida nos pacientes com Lesão de 1 ou 2 vasos  e o objetivo era a recanalização com fluxo TIMI 3 da artéria CULPADA. Nos pacientes triarteriais importantes ( lesão 100% + 2 lesões >90%), lesão em TCE ou falha da angioplastia, a cirurgia de revascularização completa  era preferida. Apesar dos pacientes submetidos a revascularização cirurgicas apresentarem doença arterial mais severa a mortalidade entre as duas modalidades foi semelhante.

Como resultado, observou-se que não houve diferenças estastísticas na mortalidade em 30 dias. Porém em 6 meses a estratégia de revascularização de emergência  foi claramente superior, salvando 13 vidas para cada 100 pacientes tratados (50.3 % vs. 63.1 % P=0.027)., mantendo benefícios em 1 ano de seguimento. O benefício foi iminentemente observado em pacientes com menos de 75 anos, que nesse grupo chega a 20 vidas salvas  em 6 meses por 100 pacientes tratados. No pacientes com mais de 75 anos a estratégia de revascularização emergêcia foi deletérias.

Após este estudo, guidelines da ACC/AHA e diretrizes  ao redor do mundo incluiram como classe I de recomendação a estratégia de revascularização precoce na população de choque cardiogênico secundário a IAM com supra com as características acima.

 

REFERÊNCIA:

SHoCK TRIAL  –  New England Journal of Medicine – 1999

Revisão clínica: Ticagrelor

22 jan

O ticagrelor é uma medicação anti-plaquetária que age de forma diferente do clopidogrel e do prasugrel (pertencentes a classe dos tienopiridínicos). Apesar das 3 medicações terem o mesmo mecanismo de ação (inibição do receptor plaquetário P2Y12) o ticagrelor tem efeito reversível enquanto que os tienopiridínicos atuam de forma irreversível.

 A medicação foi avaliada no estudo PLATO (Platelet Inhibition and Patient Outcomes) publicado na New England em 2009. Neste trial foram randomizados 18.624 pctes em 43 países diferentes do mundo com síndrome coronariana aguda tanto com quanto sem supra de ST. Os indivíduos eram então randomizados para receber clopidogrel (dose de ataque de 300-600 mg e manutenção de 75 mg) ou ticagrelor (180 mg de ataque e manutenção de 90 mg 2xd) durante 1 ano. Todos os pctes recebiam AAS (75-100 mg/d) a não ser que não tolerassem a medicação. O end-point primário do estudo era o desfecho composto de morte por causas vasculares + AVC + reinfarto tendo ocorrido em 11,7% dos pctes que usaram clopidogrel e em 9,8% dos pctes recebendo ticagrelor (redução de 16%). Os end-points secundários incluíam a análise isolada de morte por causa cardiovasculares, AVCi e IAM. Observou-se DIMINUIÇÃO DE 21% DA MORTALIDADE por causas cardíacas (saiu de 5,1% para 4%) e de 16% do risco de IAM. Não houve diferença de AVC. Para cada 1.000 pctes tratados com ticagrelor ao invés de clopidogrel houve uma diminuição de 14 mortes, 11 infartos e 8 tromboses de stent. Interessante que NÃO HOUVE AUMENTO DE SANGRAMENTOS de uma forma geral com o uso do ticagrelor.

No subestudo do PLATO que analisou os pctes do trial que foram encaminhados para a cirurgia (<5% dos casos) notou-se um dado interessante. Apesar de não ter havido diminuição do risco de sangramento, IAM ou AVC no grupo do ticagrelor, observou-se uma importante diminuição da mortalidade tanto por causas cardiovasculares quanto por causas gerais. Esta redução ficou em torno de 50%. Começou-se a questionar se a droga poderia ter efeitos pleotrópicos que justificassem o achado mas isto ainda será motivo de muito debate.

Um dado interessante é que o fato do ticagrelor ter efeito reversível tem, como tudo na vida, um lado bom e um possivelmente deletério. A principal vantagem da reversibilidade da medicação é provavelmente o fato de poder-se usá-la de forma upstream (já na sala de emergência, antes de realização do cateterismo). Isto porque caso o cate mostre posteriormente que trata-se de caso cirúrgico é só suspender a medicação por 2 ou 3 dias e encaminhar o pcte para o procedimento, sem aumentar assim o seu risco de sangramento. Já quando usa-se o clopidogrel e o prasugrel este período sobre para 5 e 7 dias, respectivamente. Devido a este fato inúmeros serviços optam por administr r o clopidogrel apenas na sala de hemodinâmica, após ter-se descartado que o caso seja de indicação cirúrgica.  bem, mas como nem tudo são flores a reversibilidade do ticagrelor pode ter um efeito possivelmente maléfico. Sabe-se que a aderência dos pctes às medicações prescritas está bem longe do esperado. A questão é que com o ticagrelor a omissão de 3 a 4 doses da medicação já pode aumentar bastante o risco de trombose de stent. Já com o clopidogrel só começa a haver aumento significativo do risco de trombose após 3 a 5 dias da suspensão da droga. Ou seja, pctes mal aderentes são um grupo potencialmente complicado para receberem o ticagrelor a longo prazo.

Um outro possível uso do ticagrelor seria como “medicação-ponte” nos pctes que vem em uso de clopidogrel ou prasugrel e precisam ser operados por algum motivo. Explicando melhor: o que fazer com um pcte que colocou um stent farmacológico há 4 meses e descobriu ser portador de neoplasia gástrica necessitando ser submetido a gastrectomia o mais breve possível? Sabemos que nos pctes portadores de stent farmacológico a dupla antiagregação tem que ser mantida idealmente por pelo menos 1 ano. Ao parar-se o clopidogrel por um certo período ocorre um aumento exponencial do risco de trombose de stent. Ironicamente a maioria dos cirurgiões recusa-se a operar pctes em uso de clopidogrel devido ao risco aumentado de sangramentos. O que fazer? Apesar desta pergunta ainda não possuir resposta clara uma alternativa que vem sendo estudada é a possibilidade de se usar um outro antiplaquetáriocomo efeito de ponte entra a suspensão do clopidogrel e a realização da cirugia. Isto já foi feito com antagonistas 2b3a venosos. Suspende-se o clopidogrel 5 dias antes da cirurgia, iniciando-se logo apos o uso de tirofiban. Esta medicação é desligada 4-8 hrs antes da cirurgia. Assim o pcte fica “descoberto” durante curto período de tempo antes do procedimento. O mesmo princípio valeria para o ticagrelor. Suspender-se-ia o clopidogrel 5 dias antes iniciando-se de forma concomitante o ticagrelor. Este por sua vez poderia ser suspenso 2 a 3 dias antes da cirurgia. Este possível efeito do ticagrelor ainda não foi estudado em trials mas isto é questão de tempo.

Não há necessidade ajuste da dose em idosos. Nos pctes >75 anos a medicação não apresentou benefício em relação ao clopidogrel. Não é necessário ajuste pela função renal, contudo, como não foi estudado em pctes dialíticos deve-se evitar o uso de ticagrelor neste subgrupo. O mesmo pode-se dizer de pctes com hepatopatia moderada/grave.

Contra-indicações:

1- Alergia a medicação

2- Passado de AVCH

3- Hemorragia ativa

4- Hepatopatia moderada/grave

5- Pctes em diálise

6- Pctes em uso de inibidores potentes do CYP3A4 (por ex. cetoconazol, claritromicina, nefazodona, ritonavir e atazanavir)

7- Plaquetopenia importante

Como havia relato prévio de pausas ventriculares exacerbadas pelo ticagrelor, pctes com risco aumentado de bradicardia sintomática (ex: doença do nó sinusal sem marcapasso implantado, BAV de segundo ou terceiro graus, etc) foram excluídos do PLATO.

Houve aumento de dispnéia com o uso do ticagrelor no PLATO (14,2% dos pctes x 9,2% dos indivíduos que usaram clopidogrel). O motivo disto é desconhecido. 1 em cada 100 pctes do PLATO que usaram o ticagrelor tiveram que parar a medicação devido ao sintoma. Pctes com asma e DPOC têm maior risco de desenvolver dispnéia secundária a droga e assim a medicação deve ser utilizada com cautela nestes casos.

 

A medicação já foi aprovada na Europa mas recentemente teve seu lançamento cancelado no Estados Unidos. Isto deveu-se ao fato de a análise dos 1.814 pctes do PLATO provenientes dos Estados Unidos e do Canadá ter mostrado que nesta população paradoxalmente houve aumento do desfecho primário. Qual o motivo da medicação ter efeitos tão benéficos em outros países (incluindo o Brasil) e terminar atuando de forma inversa no principal mercado do mundo? Enquanto não há resposta clara o FDA mantém a aprovação da droga nos USA cancelada.

Candesartan vs Losartan – podemos acreditar no efeito de classe dos BRA?

21 jan

Os bloqueadores do receptor de angiotensina II (BRA) diminuem mortalidade e hospitalização em pacientes com insuficiência cardíaca (IC) com fração de ejeção reduzida.

Isso já foi mostrado em vários estudos. O VAL-Heft (2001), mostrou o benefício no end-point combinado mortalidade + hospitalização do uso de Valsartan associado ao IECA; o CHARM-Added (2003) também mostrou benefício da associação BRA + IECA, nesse caso com Candesartan; e o CHARM-Alternative (2003) mostrou benefício no end-point combinado mortalidade + hospitalização do uso do Candesartan naqueles que não toleram IECA. Todos esses estudos incluíram pacientes com FE ≤ 40%, sintomáticos.

Mas será que podemos usar esses achados para qualquer droga dessa classe? Podemos acreditar num efeito de classe dessas medicações?

Sabe-se que as drogas do grupo dos BRA tem afinidades diferentes pelo receptor AT1, o que poderia levar a efeitos clínicos variáveis, mas nenhuma droga havia sido comparada com outra desse mesmo grupo.

Um estudo apresentado no JAMA avaliou um registro de IC (Swedish Heart Failure Registry) de 30.254 pacientes, entre 2000 e 2009. Desses, 5.139 pacientes estavam em uso de candesartan (2.639) ou losartan (2.500).

O desfecho primário foi mortalidade por qualquer causa em 1 ano e em 5 anos. Em 1 ano, a sobrevida no grupo Candesartan foi de 90% vs 83% do grupo Losartan, e em 5 anos, 61% vs 44% (P <0,001). Aqueles que usavam Losartan tiveram 43% maior chance de morrer do que quem usava Candesartan (hazard ratio 1,43 – 95% IC, 1,23-1,65; p 0,001).

Quando avaliados as características dos grupos, os pacientes do grupo Candesartan era mais jovens e tinham IC menos grave que o grupo Losartan, e usavam mais drogas com evidências de benefício em mortalidade, como IECA e betabloqueador. Além disso, havia uma maior prevalência de pacientes com FA, DM e doença pulmonar no grupo Losartan.

O resultado desse estudo coloca em dúvida o efeito de classe dos BRA. Com isso, achados de um estudo com um determinado BRA não deveriam ser generalizados para outros medicamentos dessa classe.

Os autores sugerem que esses achados não são fortes o suficiente para afetar a decisão clínica, e que essa evidência seria mais exploratória que definitiva. São necessários novos estudos comparando diretamente essas drogas. Enquanto aguardam esses estudos, sugerem, se possível, dar preferência ao candesartan.

Devemos lembrar que esse é um estudo observacional, e não um estudo prospectivo, randomizado, duplo-cego. Além disso, dos 6 autores, 4 tem conflito de interesse com a empresa Astra-Zeneca, que produz o Atacand® (Candesartan). Novos estudos clínicos comparando diferentes drogas dessa mesma classe poderiam esclarecer de forma mais consistente essa dúvida.

Referência: Cervenka ME, Benson L, Dahlström U, Edner M, Rosenqvist M, Lund LH. Association of Candesartan vs Losartan with All-Cause mortality in patients with heart failure. JAMA 2011;305(2):175-182.

Sangramento Digestivo Alto no pcte em uso crônico de AAS – o que fazer?

19 jan

Ocasionalmente nos deparamos com o cenário de sangramento digestivo mediados por úlceras gástricas no pacientes que fazem uso crônico da aspirina tanto na prevenção primária de eventos cardiovasculares, quanto naqueles que a recebem para prevenção secundária ou estão em uso de antiagregantes devido a procedimentos percutâneos.

Antes de discutir sobre o que fazer em relação ao aas durante episódio de sangramento digestivo agudo, revisaremos as medidas que podemos tomar para evitar hemorragia digestiva alta (HDA) em pctes usuários crônicos de AAS.

1- Associação de Aspirina com protetores gástricos: Tanto inibidores de Bomba de Prótons (PPI) como Antagonistas H2 são eficazes em reduzir o risco, porém os PPI são bem mais efetivos neste contexto e são as medicações de escolha na prevenção de sangramento digestivos. As Três principais sociedades médicas Americanas já recomendam a utilização de protetores gástricos em todos aqueles pacientes com fatores de risco para Hemorragia digestiva alta e que utilizarão o AAS cronicamente.

FATORES DE RISCO PARA SANGRAMENTO RELACIONADO A ANTIPLAQUETÁRIOS:  Sangramentos digestivos prévio ( principal); Presença de úlcera péptica conhecida; Idade avançada; Uso  concomitante de anticoaculantes, estoróides e AINES; Pacientes infectados com  H. plylori

2- Mudança para Clopidogrel (controverso): Existem poucas evidências clínicas para esta atitude e muito se baseia em plausibilidade biológica que o clopidogrel não atuaria nas prostaglandinas gástricas, porém 2 estudos de caso controles revelam riscos de sangramentos similares entre clopidogrel e AAS em baixas doses ( 70-100mg). Além disto, em um clinical trial, evidenciou que AAS + inibidor de bomba ( esomeprazol ) foi mais efetivo em reduzir o risco de sangramento do que o clopidogrel isoladamente em um acompanhamento de 1 ano ( incidência de sangramento com clopidogrel de 8,6% x 0,7 % com AAS + PPI) . Portanto dá-se preferência, mais uma vez, a associar um PPI a aspirina

3- Erradicação do H. pylori : O H. plylori é associado a sangramento digestivo alto. A evidência para a sua erradicação em pctes usuários crônicos de AAS é limitada, porém ainda  é recomendada nos principais Guidelines.

Mas e se, apesar de todos os cuidados, o pcte vier a apresentar hemorragia digestiva alta na vigência do uso do AAS? O que fazer? O principal neste cenário é avaliar o motivo pelo qual o AAS foi iniciado. Um pcte que está usando AAS como prevenção primária devido a um escore de Framingham de 21% apresenta muito menos benefício de permanecer em uso de AAS do que um indivíduo que colocou um stent farmacológico há 3 semanas. Para uniformizar a conduta, propõe-se o algoritmo a seguir:

OBS:

  1. PPI utilizado foi o Pantoprazol e quando usado por via intravenosa, manteve-se infusão de 8mg/h por 72 horas. Após tratamento, os paciente foram mantido com protetores gástricos indefinidamente.
  2. No Ultimo consenso a respeito do uso de PPI e clopidogrel publicado em 2010, a interação entre estas duas medicações ainda encontra-se inconsistente e no grupo de pacientes de alto risco para sangramento, principalmente aqueles que já sangraram a balança RISCO x BENEFÍCIO pende para a recomendação da associação, corroborando a publicação acima.

REFERÊNCIAS:

Should Prophylactic Low-dose Aspirin Therapy be Continued in Peptic Ulcer Bleeding?

Drugs: 1 January 2011 – Volume 71 – Issue 1 – pp 1-10. Current Opinion

ACCF/ACG/AHA 2010 Expert Consensus Document on the Concomitant Use of Proton Pump Inhibitors and Thienopyridines –

J Am Coll Cardiol, 2010; 56:2051-2066, doi:10.1016/j.jacc.2010.09.010

Qual o anti-inflamatório mais seguro em pctes cardiopatas?

15 jan

Metanálise lançada no BMJ em 11 de janeiro de 2011 avaliou as consequências do uso de anti-inflamatórios não hormonais(AINES) em relação a eventos cardiovasculares (IAM, AVCi, morte por doença cardiovascular). Foram avaliados 31 estudos que englobaram um total de 116.429 pctes. O que se viu que foi que todas as medicações estudadas (naproxeno, ibuprofeno, diclofenaco, celecoxib, etoricoxib, lumiracoxib, rofecoxib) causaram aumento de eventos cardiovasculares. É mais um estudo que corrobora que todos os AINES aumentam o risco cardiovascular dos pctes. Nesta metanálise a medicação que acarretou menor aumento de eventos cardiovasculares foi o naproxeno. Isto condiz com estudo publicado em 2009 no circulation em que o grupo chefiado pelo Dr Wayne Ray avaliou um total de 48.566 pctes através de uma coorte retrospectiva, mostrando ao final que o naproxeno era o AINE com perfil cardiovascular mais favorável.

O importante é saber que o ideal é evitar por completo esta classe de medicações em pctes com risco cardiovascular aumentado. No manejo de dores crônicas deve-se priorizar outros grupos de medicações (paracetamol, opióides fracos, etc). Caso seja fundalmental o uso de AINES, tentar usar a medicação pelo menor tempo possível, na menor dose que controle os sintomas do pcte. Priorizar nestes casos o uso de naproxeno, baseado nas evidências que dispomos até o momento.

Referência:  Trelle S, Reichenbach S, Wandel S, et al. Cardiovascular safety of non-steroidal anti-inflammatory drugs: Network meta-analysis. BMJ 2011; DOI:10.1136/bmj.c7086.

Dupla antiagregação plaquetária após stent farmacológico: uma questão de vida ou morte!

14 jan

Os guidelines atuais que falam sobre o uso de dupla antiagregação plaquetária após o implante de stents farmacológicos são categóricos em afirmar que o aas + clopidogrel deve ser mantido por mínimo 12 meses após o procedimento. Estudo publicado esta semana no American Journal of Cardiology reforça mais uma vez o motivo disto. Foram acompanhados 1.358 pctes submetidos ao implante de stent farmacológico durante um período de 36 meses. Todos eram liberados do hospital em uso de dupla antiagregação e orientados a usar a medicação pelo período mínimo de 1 ano. O que se viu é que 8,8% dos pctes haviam parado de tomar uma das ou as duas medicações após 1 ano de acompanhamento. Ou seja, praticamente 1 em cada 10 pctes não seguiu a recomendação médica. Pode parecer pouco, mas ao olharmos para o resultado é fácil de perceber que isto pode ser a diferença entra a vida e a morte.

No grupo que manteve a dupla antiagregação a mortalidade de causas cardiovasculares após um ano foi de 1,2%. Já no grupo que não seguiu o regime terapêutico sugerido a mortalidade foi de 5%. Este aumento de mortalidade ocorreu basicamente às custas de trombose aguda de stent, como era de se esperar (aumentou de 3,4% para 7,6% devido a ausência de dupla antiagregação). O risco cardiovascular aumentava apenas quando a parada do uso de uma das medicações ocorria por um período maior do que 5,5 dias. Isto provavelmente se deve ao fato de que tanto o aas quanto o clopidogrel mantém efeito antiplaquetário por 5 a 7 dias (daí a recomendação de parar o clopidogrel 5-7 dias antes de cirurgias eletivas).

Em muitos dos casos de discontinuação o motivo foi a orientação de outros médicos (não cardiologistas) ou de odontologistas devido a realização de procedimentos invasivos.

Pontos importantes que tiramos do estudo:

1- Os pctes têm que ser orientados sobre a fundamental importância de usar o aas e clopidogrel rigorosamente por pelo menos 1 ano após o implante de stents farmacológicos. Deve-se deixar explícito que caso não sigam tal recomendação HÁ RISCO DE MORTE.

2- Os pctes devem ser orientados suspender o uso do aas e/ou do clopidogrel apenas após orientação de médico habilitado, de preferência o cardiologista que o acompanha. Se houver necessidade de realização de procedimento cirúrgico no primeiro ano após o implante de stent farmacológico o cardiologista deve avaliar qual a conduta adequada – suspender o procedimento caso não seja fundamental? Fazer o procedimento em vigência de dupla antiagregação? Parar o clopidogrel 5 dias antes e fazer “ponte com tirofiban” até a realização do procedimento? São várias as alternativas mas sempre o cardiologista deve estar envolvido na decisão final.

Referência: Rossini R, Capodanno D, Lettieri C, et al. Prevalence, predictors, and long-term prognosis of premature discontinuation of oral antiplatelet therapy after drug eluting stent implantation. Am J Cardiol 2011; 107:186-194

Idoso com síndrome coronariana aguda – como manejar as medicações antitrombóticas?

12 jan

       

– Doença arterial coronária é a principal causa de morte em idosos. Quanto maior a idade do pcte, maior o risco de complicações hemorrágicas das medicações usadas para tratar síndromes coronarianas agudas (ex: heparina, inibidores da glicoproteína 2b3a, etc). É fundamental para o cardiologista saber usar adequadamente estas medicações neste cenário.

AAS – o benefício do aas na prevenção secundária de coronariopatia no idoso é bem definida. O uso da medicação em pctes com eventos vasculares prévios na populção acima dos 65 anos diminuiu o risco de morte por doença vascular, AVCi ou IAM em 19,4%. A redução do risco absoluto nos pctes maiores que 65 anos foi até superior a dos pctes mais jovens. O risco de sangramento aumenta um pouco na população idosa mas a relação risco/benefício é nitidamente favorável ao uso da medicação. Deve-se usar doses entre 75 e 150 mg/d – mesmo efeito benéfico que doses maiores e menor risco de sangramento.

Antagonistas da adenosina –  não há maiores particularidades em relação ao uso de clopidogrel em idosos com a possível excessão de evitar a dose de ataque (300-600 mg) nos pctes maiores que 75 anos que vão ser trombolisados no IAM com supra de ST. Já em relação ao prasugrel, o que se observou no TRITON foi que pctes com >75 anos não tinham benefício com o uso da medicação no lugar do clopidogrel uma vez que a diminuição de eventos isquêmicos era anulado pelo aumento do risco de sangramento. Assim, não se costuma usar a medicação acima desta faixa etária. Não quer dizer que a medicação é contra-indicada como nos casos que já tiveram AVCi, por exemplo. Simplesmente não há vantagem em relação ao clopidogrel que é uma medicação mais barata. O uso de doses menores neste subgrupo (manutenção de 5 mg/d) será avaliada em outros estudos. Já em relação ao ticagrelor o que se viu no PLATO foi que o grupo acima de 65 anos apresentou benefício maior que o grupo <65 anos e com risco de sangramento igual. Já no subgrupo com >75 anos a medicação não foi superior ao clopidogrel. Ou seja, entre 65 e 75 aos – vale a pena e é melhor que o clopidogrel. Nos pctes com >75 anos – tanto faz ticagrelor ou clopidogrel e o clopidogrel é mais barato.

Inibidores da glicoproteína 2b3a – metanálise avaliou resultado de 6 trials diferentes que usaram este grupo de medicações em pctes idosos. O que se observou é que acima dos 70 anos parece haver perda do efeito benéfico destas medicações com aumento de 62% no risco de sangramento.  É fundamental estar atento, caso opte-se por utilizá-las em idosos, para a correção da dose pelo peso corporal e de corrigir o tirofiban pela função renal.

Heparinas – nos pctes com >75 anos, corrigir a dose do clexane para 0,75 mg/kg a cada 12 hrs.

Inibidores diretos de trombina – o trial ACUITY mostrou que em pctes com SCA sem supra de ST o uso da bivalirudina diminuiu bastante o risco de sangramento, principalmente no grupo de pctes com >75 anos. A medicação parece ser uma excelente alternativa a heparina neste subgrupo.

– Referência: Capodanno D, Angiolillo DJ. Antithrombotic therapy in the elderly. JACC Vol. 56; 2010: 1683-92.

CHADS-VASc: um melhor escore para avaliar risco de eventos tromboembólicos?

12 jan

A fibrilação atrial é a arritmia cardíaca sustentada mais comum, acometendo 1-2% da população em geral. Sabe-se que a FA aumenta consideravelmente o risco de eventos tromboembólicos. Assim, a anticoagulação é sempre uma preocupação em pacientes que apresentam essa arritmia.

Mas quem devemos anticoagular? Em 2001, unindo estudos prévios (SPAF + AFI), foi criado um escore de risco de eventos tromboembólicos – o CHADS2. Se pontuação de 2 ou mais, estaria indicada a anticoagulação plena, pelo alto risco de eventos (warfarina, para um INR de 2,0 a 3,0). Se risco intermediário (escore de 1),  poderiamos antiagregar ou anticoagular, dependendo do paciente (com tendência a um maior benefício da anticoagulação para esses pacientes).

Uma crítica ao escore CHADS2 e à outros escores existentes (como o Framingham) é que eles tinham muitos pacientes em risco intermediário, quando seria questionável a anticoagulação. Por isso, foi desenvolvido um novo escore de risco – o CHA2DS2-VASc.

Esse escore foi validado em um estudo apresentado no Chest. Avaliou 5.333 pacientes ambulatoriais ou internados com FA. Foram incluídos aqueles que tinham mais de 18 anos, com FA documentada em ECG ou Holter nos últimos 12 meses. Foram excluídos aqueles com estenose mitral ou cirurgia valvar prévia. Foi avaliado mortalidade, eventos adversos (AVC, AIT, embolia periférica, TEP) e fatores de risco. Dos pacientes que tinham todos dados avaliados, 1084 (69%) foram incluídos, com um seguimento de 1 ano.

O escore de risco de Birmingham 2009 – (ou CHA2DS2-VASc) está descrito abaixo:

Foi considerado alto risco se pontuação de 2 ou mais, risco intermediário se 1 ponto, e baixo risco se sem fatores de risco. A comparação entre a distribuição dos riscos e eventos entre esse novo esquema e o CHADS2 está demonstrado na tabela abaixo.

A conduta de acordo com a classificação, segundo sugerido nesse artigo, seria:

  • ALTO RISCO (2 pontos ou mais): anticoagulação plena (warfarina, para INR entre 2,0 e 3,0)
  • RISCO INTERMEDIÁRIO (1 ponto): anticoagulação plena ou antiagregação (AAS 75 a 325mg/dia) – o algoritmo da ACCP recomenda anticoagulação plena sempre que possível.
  • BAIXO RISCO (0 pontos): antiagregação (AAS) ou nada – o benefício do uso do AAS para esse grupo não está bem estabelecido. Além disso, o uso do AAS pode levar a eventos adversos.

Devemos levar em consideração que 31% dos pacientes incluídos no início desse estudo não tiveram a coleta adequada dos dados de eventos tromboembólicos, e portanto não foram utilizados na análise.

O CHA2DS2-VASc classificou uma pequema parcela em risco intermediário. Pacientes em baixo risco tiveram uma pequena taxa de eventos. O CHA2DS2-VASc mostrou-se então um esquema simples para estratificação de risco, com algumas melhorias em relação ao escore CHADS2.

Referência: Lip GYH, Nieuwlaat R, Pisters R et al. Refining clinical risk stratification for predicting stroke and thromboembolism in atrial fibrillation using a novel risk fator-based approach: The Euro Heart Survey on Atrial Fbrillation. Chest 2010 137:263-272.

Análogo de hormônio tireoidiano para tratar dislipidemia

11 jan

                          

É conhecida a associação que existe entre função tireoidiana e dislipidemia, tanto assim que o hipotireoidismo é uma causa frequente de dislipidemia secundária à custa de hipercolesterolemia (aumento de LDL principalmente) . Durante muitos anos houve tentativas de desenvolver análogos de hormônios tireoidianos que tivessem efeitos benéficos, como na redução de lípides, mas que não carregassem consigo os potenciais efeitos maléficos do hipertireoidismo como osteoporose e tendência a arritmias.

Os efeitos benéficos em lípides são mediados por receptores de hormônios tireoidianos beta e os efeitos arritmogênicos são determinados pela ação de hormônios tireoidianos na musculatura cardíaca por meio de receptores alfa. Assim, foi desenvolvido um análogo de hormônio tireoidiano, o EPROTIROME, que têm afinidade 10X MAIOR PARA OS RECEPTORES BETA .

Estudo randomizado com duração de 12 semanas foi desenvolvido para avaliar a eficácia e segurança dessa droga em associação com terapêutica clássica para hipercolesterolemia (sinva 40 ou atorva 20) em pacientes que não tinham chegado no alvo de LDL apenas com uso de estatinas. Resultados:

– proporção de pacientes que atingiu LDL <100 após 12 semanas de estudo foi: 6% para estatina placebo versus 36%, 50% e 57% nos que usaram estatina + 25, 50 ou 100 mcg de eprotirome

– queda de Tg após 12 semanas de estudo foi: – 5 % para estatina placebo versus -16%, -16% e -36% nos que usaram estatina + 25, 50 ou 100 mcg de eprotirome

– queda de lipoproteína A/  Lp(a)  após 12 semanas de estudo foi: – 10 % para estatina placebo versus -27%, -32% e -43% nos que usaram estatina + 25, 50 ou 100 mcg de eprotirome

– não houve alteração de TSH e o T4l se manteve nos valores de referência com tendência a ficar no limite inferior

– não houve alteração de peso, FC, PAS ou PAD nem foi desenvolvida nenhuma alteração eletrocardiográfica

Resumindo:

– associação de eprotirome foi mais eficaz em reduzir LDL do que seria dobrar a dose da estatina que vinha em uso

– houve redução de dois paramêtros de risco cardiovascular: Tg e Lp(a) que sabidamente têm pobre resposta às estatinas

não houve efeitos colaterias cardíacos, ósseos ou na secreção hipofisaria de TSH

Referência : Ladenson PW, Kristensen JD, Ridgway EC, Olsson AG, Carlsson B, Klein I, Baxter JD, Angelin B. N Engl J Med. 2010 Mar 11;362(10):906-16.

FAME trial – a importância da FFR na prática clínica

10 jan

A FFR (fractional flow reserve) é uma técnica de cateterismo que está sendo aplicada nos últimos anos para guiar intervenções coronarianas. Constitui-se de uma técnica em que se passa um fio-guia pela lesão e comparando a pressão antes e depois da obstrução é capaz de dizer se aquela lesão está trazendo repercussões funcionais para o pcte. Caso a FFR mostre relação <0,75-0,80 a lesão é considerada funcionalmente importante, devendo portanto ser tratada por método de revascularização (percutânea ou cirúrgica). Por se tratar de uma análise funcional é teoricamente mas útil para o médico do que apenas o aspecto visual da placa na angiografia.

O estudo DEFER ( Deferral of Percutaneous Coronary Intervention) já havia mostrado que deixar de  angioplastar lesões com FFR >0,75-0,8 não piorava os resultados após 5 anos de acompanhamento. Contudo, o trial FAME (Fractional FLow Reserve Versus Angiography for Multivessel Evaluation) mostrou que angioplastar lesões com FFR >0,8 na verdade pode piorar o prognostico do pcte. Isto deveria-se principalmente aos eventos adversos relacionados com a colocação de stents farmacológicos (ex: trombose de stent, reestenose).

No trial original as lesões coronarianas eram classificadas pelo hemodinamicista como: 50-70% , 71-90% e >90% de estenose. Em um grupo de pctes passava-se FFR para guiar a angioplastia. O que se viu é que 65% das lesões entre 50 e 70% não eram significantes!!! Nas lesões entre 71 e 90% um total de 20% tinha FFR>0,8. Já no gupo de lesões críticas (>90% de estenose) apenas 4% possuíam FFR>0,8. Avaliando-se o grupo de pctes triarteriais em apenas 14% dos casos havia lesões com FFR <0,8 nos 3 vasos e em 9% dos casos não havia nenhuma lesão com FFR alterado.

O que o FAME trial fez foi então dividir os pctes em 2 grupos – um em que se tratava a lesão baseado apenas no aspecto angiográfico (que é o que se faz na prática clínica cotidiana) e um outro grupo em que se tratava as lesões baseadas na FFR (só se angioplastava as lesões com FFR<0,8). Todas as angioplastias eram realizadas com stents farmacológicos. Após 2 anos de seguimento o que se viu é que o segundo grupo usou uma quantidade menor de stents por pcte (2 versus 3 do grupo guiado por angiografia) e que mesmo assim houve diminuição de eventos (Morte ou IAM) de 12,9% no grupo controle para 8,4% no grupo guiado por FFR.

Muitos locais não usam a FFR de forma mais ampla devido a questão do custo. Contudo, o que subanálise do FAME mostrou é que o tratamento guiado por FFR economizou dinheiro uma vez que menos stents farmacológicos foram implantados. 500 lesões deixaram de ser tratadas devido a informação de FFR>0,8 e destas houve apenas o registro de 1 IAM ao longo dos 2 anos de acompanhamento (0,2% incidência). Isso mostra que o método realmente é confiável em mostrar que lesões devem ser tratadas e que lesões devem ser mantidas em tratamento clínico.

Os resultados do estudo são bastante claros em mostrar que a avaliação de lesões entre 50 e 70% de estenose é extremamente falha quando considerado apenas o aspecto angiográfico. Mesmo nas lesões com estenose entre 71 e 90%  ainda há uma grande taxa de falha na detecção das lesões funcionalmente importantes. Este conhecimento pode explicar em boa parte o fato de que estudos prévios que avaliaram angioplastia na doença arterial crônica não mostraram diminuição de IAM e morte a longo prazo quando comparado com o grupo de tratamento clínico (EX: courage trial). Provavelmente muitas das lesões tratadas nestes trials possuíam FFR>0,8 e poderiam ter sido mantidas em tratamento clínico.

Os resultados deste trial inclusive já influenciaram os guidelines europeus de revascularização miocárdica. Neste documento lançado no final de 2010 entre as indicações de revascularização (cirúrgica ou percutânea) são citadas lesões de tronco>50% , de da proximal >50% e de vaso derradeiro >50% desde que associados a prova isquêmica positiva ou a FFR<0,8 em casos de estenose entre 50% e 90%. Nos casos de estenose >90% pode-se tratar a lesão sem realizar FFR ou prova isquêmica já que se sabe que em 96% das vezes a FFR será alterada. Se uma prova isquêmica vier negativa neste caso é mais fácil que se seja um resultado falso-negativo e o médico terminará tratando a lesão de qualquer forma. Se um exame não vai alterar a decisão clínica, não deve ser realizado.

Referência: Tonino PAL, De Bruyne B, Pijls NH, et al. Fractional flow reserve versus angiography for guiding percutaneous coronary angiography. N Engl J Med 2009; 360: 360: 213-224.

Disfunção erétil e doença cardiovascular – como manejar?

9 jan

                  

– Disfunção erétil é um grande preditor de doença arterial coronária, principalmente em pctes <60 anos. Inversamente, inúmeros pctes com coronariopatia conhecida têm disfunção erétil (até 75% dos casos, dependendo da série). Assim, é importante o cardiologista saber manejar os pctes que se apresentam com as 2 condições.

– Disfunção erétil é definida como a incapacidade de atingir e manter uma ereção adequada para realizar o intercurso sexual. É considerada um fator de risco cardíaco, aumentando a mortalidade (HR 1,43) às custas  de eventos cardiovasculares. Costuma preceder estes eventos em 3 a 5 anos o que dá ao cardiologista uma janela terapêutica para atuar sobre os fatores de risco do pcte.

– Há alguns especialistas que advogam que a disfunção erétil seja considerada um equivalente de doença coronariana, indicando assim tratamento intensivo com estatinas para manter LDL <100 e de preferência <70. Isto, contudo, ainda não é preconizado pelos guidelines.

– Todos os pctes com disfunção erétil devem ter a testosterona sérica dosada.

– Algumas medicações cardiovasculares estão ligadas a aumento de disfunção erétil: beta bloqueadores, diuréticos tiazídicos, antagonistas de canais de cálcio, estatinas e ieca. Se a disfunção erétil surge áté 4 semanas após o início de uma dessas medicações, é interessante que se pare o remédio podendo-se mudar para uma droga de outra classe ou então para uma substância diferente da mesma classe. Bloqueadores do receptor da angiotensina e o nebivolol podem diminuir a ocorrência de disfunção erétil.

– E quando o pcte com cardiopatia e disfunção erétil chega no consultório e pergunta: doutor, posso ter relações sexuais? O que fazer? Preciso solicitar algum exame? Posso liberar o pcte??? Para uniformizar a conduta um consenso de especialistas definiu critérios objetivos para ajudar o clínico. Os pctes são divididos em 3 categorias de risco: baixo, intermediário e alto risco de complicações ao realizar atividades sexuais.

1- Baixo risco – exemplo – pctes assintomáticos com ❤ fatores de risco cardiovasculares; HAS controlada; angina estável CCS 1; pós revascularização (PCI ou RM) sem sinais de isquemia residual importante; IAM há mais de 6 semanas; FA com FC controlada; ICC NYHA 1 – pode realizar atividade sexual sem necessidade de exames complementares

2- Risco intermediário – exemplo – assintomático com 3 ou mais fatores de risco cardiovasculares; angina CCS 2 ou maior; IAM há mais de 2 semanas e há menos de 6 semanas; ICC NYHA 2; vasculopatia peirférica sintomática (AVC prévio, doença arterial periférica, etc) – realizar exames adicionais como provas isquêmicas não invasivas (cintilografia miocárdica, teste ergométrico, eco stress)

3- Alto risco – exemplo – IAM há <2 semanas; angina instável; HAS não controlada; ICC NYHA 3 ou 4; arritmias de alto risco; estenose valvar moderada ou grave; cardiomiopatia hipertrófica – não realizar atividade sexual enquanto a cardiopatia não estiver estabilizada

– Em pctes com coronariopatia e disfunção erétil os inibidores de fosfodiesterase (ex: sildenafil) podem ser usados com segurança, devendo ser evitados apenas naqueles que usam nitratos devido ao risco de hipotensão importante. 

– A dose inicial do sildenafil (viagra) em pctes com disfunção erétil é de 50 mg demorando a medicação 60 minutos para atingir o pico de ação. Assim, deve ser ingerida 30-60 minutos antes de relações sexuais. Em pctes com >65 anos, ClCr<30 mL/min, disfunção hepática ou em uso de medicações que inibam o citocromo P450 3A4 (eritromicina, cetoconazol, inibiodres de protease, por exemplo) – iniciar com 25 mg. A dose máxima é de 100 mg.

– Referência:  Bryan G. Schwartz, MD; Robert A. Kloner, MD, PhD. Erectile dysfunction and cardiovascular disease. Circulation 2011; 123; 98-101

FA – vale a pena ablacionar?

7 jan

      

Estudo publicado no JACC esta semana relata a experiência de um grupo francês em relação a ablação para tratamento de FA. Foram avaliados 100 pctes que foram submetidos ao procedimento entre 2001 e 2002 no Hôpital Cardiologique du Haut-Lévêque. Após 1 procedimento de ablação apenas 29% dos pctes ficaram completamente livres da arritmia após 5 anos de acompanhamento. A maioria dos pctes teve que ser submetido a mais de um procedimento ao longo do acompanhamento do estudo devido a recorrência da arritmia. Importante notar que a maioria dos pctes submetidos a abalação eram jovens, saudáveis e não obesos. Desta forma, existe a possiblidade de os resultados serem ainda piores no mundo real (pctes mais idosos, corações estruturalmente mais alterados, etc).

O estudo nos leva a pensar no papel da ablação no manejo desta arritmia tão frequente. O uptodate do guideline americano de FA lançado recentemente coloca como classe I a realização do procedimento nos pctes com sintomas significantes , FA paroxistica refratários a tratamento medicamentoso e que têm atrio normal ou dilatado discretamente e sem doença pulmonar importante, desde que realizado em centro com experiência.

Outro fato importante de ser levantado é em relação ao uso de anticoagulantes após a ablação da FA. Alguns centros advogam usar o marevan durante 6 meses após o procedimento e, caso o pcte permaneça em ritmo sinusal neste período, retirar o anticoagulante. Já outros locais optam por manter o anticoagulante indefinidamente caso o pcte tenha CHADS maior ou igual ou 2 (e em certos casos de CHADS 1). Considerando que em 5 anos 71% dos pctes apresentam recorrência da arritmia em algum momento, a segunda estratégia parece ser mais prudente em minha opinião.

Referência: Weerasooriya R, Khairy P, Litalien J, et al. Catheter ablation for atrial fibrillation. J Am Coll Cardiol 2011; 57:160-166.

HAS-BLED – uma nova forma de medir o risco de sangramento em pctes anticoagulados

6 jan

          

A fibrilação atrial é uma das principais causas de AVC no mundo. Atualmente existem vários escores diferentes para medir o risco do pcte com esta arritmia ter no futuro um evento cerebral (como o CHADS2 ou o CHA2DS2 VASc). Os pacientes com risco maior geralmente são tratados com anticoagulantes. Contudo, estes protegem o indivíduo de eventos embólicos mas os coloca em risco de sangramento. O ideal então seria ter algum escore que dissesse ao médico de forma mais precisa qual o risco de determinado pcte apresentar sangramentos importantes quando do uso de marevan ou outros anticoagulantes. Foi com esse objetivo que criou-se o escore HAS-BLED, recentemente validado em mais um estudo. O escore traz 9 fatores de risco para sangramento em pctes usando marevan. cada fator soma 1 ponto na conta final. Quanto maior o número de fatores de risco, maior o risco de sangramento. Os fatores são os seguintes:

Hipertensão – PAS >160 mmHg

Alteração da função renal (1 ponto) ou hepática (1 ponto) – Cr>2 ou necessidade de diálise; Cirrose ou Bilirrubinas >2x normal + TGO/TGPFosfatase alacalina>3x o normal

Stroke (AVC prévio)

Bleeding (sangramento prévio ou predisposição a sangramento como coagulopatia)

Labile INRs (RNIs que variam muito ou que estão em <60% das vezes na faixa terapêutica)

Elderly (>65 anos)

Drogas (1 ponto) ou alcoolismo (1 ponto) – uso de antiplaquetários, AINES ou corticóide; uso abusivo de álcool

De forma geral, pctes com esocre maior ou igual a 3 são considerados de alto risco para sangramento. Um dado importante estes pctes não possuem contra-indicação ao uso de anticoagulantes mas se forem submetidos a tal terapêutica têm que ser acompanhados de forma mais intensiva. Outro dado importante é que este escore também prediz risco aumentado de sangramento com o uso de aas. Assim, não vale aquele conceito de: Ah, o pcte tem um HAS-BLED alto então vamos usar aas no lugar do marevan. Isto não se aplica. O risco de sangramento com o marevan quando bem controlado (RNI entre 2 e 3) são é superior ou do pcte que usa aas e o marevan protege de forma muito mais eficaz o indivíduo contra eventos embólicos.

Outro dado relevante é que este escore não foi validado para os novos anticoagulantes (rivaroxaban, apixaban, dabigatrana).

Referência: Lip GYH, Frison L, Halperin JL, et al. Comparative validation of a novel risk score for predicting bleeding risk in anticoagulated patients with atrial fibrillation. J Am Coll Cardiol 2011; 57:173-80.

Quase 1/4 dos CDIs implantados nos Estados Unidos não seguem indicações de guideline

5 jan

                     

Estudo lançado no JAMA fez uma análise retrospectiva sobre o implante de 111.707 CDIs implantados no Estados Unidos entre 2006 e  2009. Viu-se que 22,5% dos procedimentos não estavam incluídos nas recomendações formais dos guidelines americanos. As principais causas foram:

1- CDI para prevenção primária em pcte com ICC e FE<35% com menos de 3 meses do início dos sintomas de insuficiência cardíaca (os guidelines americanos recomendam aguardar pelo menos 3 meses do início do quadro)

2- Pctes com IAM há <40 dias e com FE <30% (os guidelines recomendam aguardar pelo menos 40 dias do IAM para pensar em colocar CDI como profilaxia primária nestes casos. Isto se baseia no estudo DINAMIT que não mostrou melhora do prognóstico com CDIs implantados antes deste período)

3- Pctes com NYHA IV (os guidelines não recomendam o implante de CDI em pcte com este grau de sintomas).

Os pacientes que forma submetidos ao implante de CDI não embasados pelos guidelines tiveram mais complicações intra-hospitalares do que o outro grupo (risco de morte de 0,57% x 0,18%, por exemplo). E isto às custas de um procedimento que teoricamente não traria nenhum benefício para o pcte. Além disso o custo do implante de um CDI é bastante elevado.

O estudo não tem tanta relevância para a realidade brasileira. O SUS não cobre de uma forma geral o implante de CDI com indicação para prevenção primária. Os planos de saúde por sua vez quando cobrem o procedimento geralmente são bastante rigorosos em relação a indicação do mesmo.

Referência: Al-Khatib SM, Hellkamp A, Curtis J, et al. Non-evidence-based ICD implantations in the United States. JAMA 2011; 305:43-49.

Morte Súbita em Cardiomiopatia Hipertrófica

1 jan

A indicação de profilaxia primária com CDI para pacientes com cardiomiopatia hipertrófica (CMH) foi sempre um tema controverso. Enquanto alguns indicariam o implante do CDI com apenas 1 fator de risco (para profilaxia primária), outros exigem a presença de pelo menos 2 fatores.

Mas afinal, será que a prevenção primária vale a pena em pacientes com cardiomiopatia hipertrófica? Nos consensos,  tem indicação classe IIa.

Estudo de coorte do grupo do Dr. Maron (JAMA 2007 298:405) avaliou 506 pacientes com CMH que implantaram CDI. 35% dos pacientes de prevenção primária que receberam terapias para arritmias ventriculares potencialmente letais tinham apenas 1 fator de risco.

E qual as diferenças entre esses fatores de risco? Um estudo europeu (EHJ 2010) testou os 5 fatores de risco em 1306 pacientes. Foi demonstrado que a história familiar de morte súbita cardíaca (MSC) seria o fator com maior impacto no prognóstico desfavorável, principalmente se mais de 1 familiar com MSC. Se 2 familiares com MSC, há uma probabilidade razoável de evento ainda na infância ou adolescência. Os outros 4 fatores de risco começam a influenciar o prognóstico de maneira mais lenta, a partir da segunda década de vida. A resposta anormal da pressão não mostrou o mesmo benefício dos demais em uma das metodologias utilizadas.

Apesar de toda investigação, nossa capacidade de estratificar o risco de MSC ainda é limitada. Pacientes com 1 fator de risco apresenta risco de MSC em torno de 1% ao ano. Se 3 ou mais fatores de risco, 5% ao ano. E se evento prévio (FV/TV), 10% ao ano.

Segundo as diretrizes brasileiras de Dispositivos Cardíacos Eletrônicos Implantáveis de 2007, a indicação para implante de CDI em CMH seriam: Classe I, como prevenção secundária – antecedente de FV / TV sustentada de causa não reversível; Classe IIa, como prevenção primária – presença de 1 ou mais de 4 fatores de risco maiores: a) história de morte súbita cardíaca (MSC) prematura em 1 ou mais parentes de 1º grau ou com idade acima de 50 anos; b) Hipertrofia ventricular expressiva (>30mm); c) pelo menos 1 episódios de TVNS > 120bpm ao Holter 24hs; d) Síncope inexplicada, afastada origem neurocardiogênica. (todos com expectativa de vida de pelo menos 1 ano). Foram definidos como fatores de risco menores a presença de FA, obstrução de via de saída de VE e mutações de alto risco. A fibrose miocárdica avaliada pela ressonância magnética também vem sendo estudada para auxiliar a determinar o risco de eventos. Na prática, aqui no Brasil, devido ao alto custo do CDI, dificilmente se indica esse dispositvo na presença de somente 1 fator de risco.

As diretrizes americanas consideram como fatores de risco, além dos 4 presentes no consenso brasileiro, também a presença de resposta anormal da pressão arterial ao exercício (não elevação ou queda da pressão sistólica > 20mmHg no exercício).

PARTNER Trial – Implante Percutâneo de valva aórtica

30 dez

A estenose Aórtica  é uma das principais valvulopatias de acometimento mundial.  O comprometimento valvar é insidioso e quando sintomático evolui com até 50% de mortalidade em 2 anos  sinalizando assim,  a necessidade de tratamento cirúrgico. No entanto em até 1/3 dos pacientes nesta condição  não são candidatos a cirurgia de troca valvar devido a  idade muita avançada, disfunção ventricular ou múltiplas comorbidades valendo-se apenas  do tratamento clínico e/ou valvuloplastia aórtica . Neste contexto, surgiu o PARTNER Trial publicado em outubro de 2010 que avaliou  Implante de Valva Aórtica Percutânea  (Sapien – Edward Lifesciences) para Estenose Aórtica em Pacientes não Candidatos à Cirurgia Cardíaca.

O Estudo foi multicêntrico e utilizou como critérios de inclusão pacientes com Estenose Aórtica Severa Sintomática ( área <0,8cm2 / gradiente VE-Ao: >=40mmHg / pico de Jato > 4mm /s ) com todos pacientes em classe funcional ( NYHA) maior que  II.  Foram randomizados  pacientes entre 2007 a 2009 e divididos em 2 grupos ( grupo A: 700 pacientes candidatos a cirurgia porém com  estimativa de Risco pela STS >=10% ou por avaliação de comorbidades que preveem mortalidade em 30 dias >=15% – ou seja alto risco cirurgico /  grupo B:358  pacientes  não candidatos a cirurgia devido a comorbidades e que estimativas indicam mortalidade >=50% em 30 dias avaliados por 1 cardiologista e 2 cirurgiões – pcte muito alto risco) . O grupo 2 foi comparado com tratamento clínico incluindo valvuloplastia com balão ( dados aqui comentados) e o grupo 2  com a cirurgia convencional de troca valvar ( dados deste braço ainda não pulblicados) – sendo  acompanhados por 1 ano.

No braço da avaliação dos 358 pacientes não eleitos a tratamento cirúgico, o implante percutâneo foi superior ao tratamento clínico convencional ( incluindo-se valvuloplastia  percutânea) reduzindo:

  • Mortalidade por qualquer causa em 46% ( NNT: 5) ; – desfecho primário
  • Desfecho combinado de óbito e re-hospitalização  em 54% ( NNT:3,4) – Desfecho primário
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  • Mortalidade Cardiovascular em 61% ( NNT: 4,1) – Desfecho secundário
  • Melhora de sintomas e teste de caminhada de 6 minutos

Como complicação principal , foi evidenciado aumento do Risco de AVC ( relacionado ao procedimento ) que futuramente pode ser controlados com dispositivos de implante percutâneo menos calibrosos e devices de proteção cerebral.

O objetivo de avaliar a superioridade do implante percutâneo nesta população foi alcançado e com NNT baixos evidenciando o benefício e novo panorama no tratamento desta patologia.

FONTE: Leon MB, Smith CR, Mack M, et al. Transcatheter Aortic-Valve Implantation for Aortic Stenosis in Patients Who Cannot Undergo Surgery. N Engl J Med 2010; 363:1597-1607.